terça-feira, 24 de março de 2009

Texto para peça de teatro: a verdade absoluta…

E, sentado no penhasco sobranceiro ao mar, pensou e viu:

terra, mar, vida sempre igual, em dias de mágoas diferentes.

O destino assim o quis e assinalou, arbitrariamente, o seu caminhar noutro trilho: o do trabalho, o da consentida resignação mas, ao mesmo tempo, de mal iniciada mas calculada revolta.

Nessa, talvez tarde, quase noite, sempre alheio ao mundo que o forçaram a reter, em nacos de sonhos efémeros, decidiu e, ficou decidido, que a sua vida não seria mais terra, mar, mas sonho, tornado realidade, de menino, depois homem escultor de almas, outras criaturas aladas que desafiavam e venciam todos os ventos e procelas.

Uns pisavam a terra, ele alimentava-se dela; outros bebiam “saborosos néctares" feitos de sorrisos mercenários e de suores de mil suores escravos, e ele bebia, perto da terra, o sal do rosto, sempre o sal da terra.

E, nesse momento de revelação, do finito e do infinito, decidiu que seria outro Deus, émulo do que o obrigaram a conhecer e que, depois, abjurara.

Agora, sentindo-se mais poderoso, porque aprendera, sublimando, e retivera, experimentando, o dom de criar e de destruir, criando; o de amar e de odiar, amando; o de chorar e de sorrir chorando; o de viver e de morrer, vivendo.

Então, sendo um eleito e revelado, abandonou as alfaias escravas, ergueu a cabeça, agora iluminada, compôs a capa do calor e do frio, capa do tempo, em gesto magnânimo de novel príncipe, e partiu a pregar essa nova verdade revelada:

Sou Deus, escrevi nova Bíblia e, tenho para partilhar, um novo Amor.

Aldeia do Meco, 10 de Junho de 1998.
A Feira do Relógio

Nesta feira de sempre,
onde tudo se compra e se julga comprar:
nacos de esperança,
bugigangas, pequenos tesouros,
em planície de asfalto e de lona,
acampamento sem fim.
Turbilhão de vozes,
mar de rostos,
num cheiro de muitos cheiros.
Mas a feira depressa se tornou
num som de sons, num vício,
numa nostalgia e num sonho.
Nesta agora feira de vento,
tudo foi vida, sonho, esperança.
Mas não se comprou o pensamento,
nem o sorriso duma criança.

Lisboa, Maio de 2002
Hoje, voltei a ter tempo
para pensar, pensar sem tempo.
Por caminhos que só eu conheço,
pedaços de infinito,
sobranceiros ao mar,
companheiro de sempre,
já meu irmão.
E tive tempo para pensar ...

Aldeia do Meco, Março de 2002

segunda-feira, 23 de março de 2009

À Aldeia do Meco, sinfonia inacabada…



Terra no fim,
Do fim da Terra.
De gente de fora,
de gentes de dentro,
gente, sempre.
Sombras aladas,
Formigar constante.
Partem com sonhos,
Chegam com esperança.
E, o chegar e partir,
fazem parar o tempo,
nessa terra sem tempo:
que acorda a dormir,
que dorme a acordar
e que vive na areia,
e que vive no mar.
O mar, a terra, o sol e o vento
são o poema do seu viver.

A.A.